31.5.07
23.5.07
21.5.07
O fenômeno murundu
Como tudo que é bom dura pouco, o murundu salta do trem na estação do Estácio. Vai espalhar sua alegria pela linha 2 de transferência, sentido Pavuna.
23.2.07
A Terra segundo o Google
A ferramenta é simples, como boa parte dos serviços da família Google (Gmail, Google Analytics etc). Dois cliques e três minutos depois e... voilà, você terá o mundo na ponta dos dedos. Para o trabalhador comum que não desfruta de utensílios básicos da aerodinâmica mundial - como um helicóptero da Daslu no quintal - e que só voa na hora de descer do ônibus, o “Earth” representa a chance de ver o teto de sua casinha pela primeira vez. Que atire a primeira pedra quem nunca teve a indiscrição de fazer o mesmo. Rico ou pobre. Alguém se habilita?
Não há ser humano, vivo ou morto, que não tenha curiosidade de ver a Terra da perspectiva da lua ou do jatinho do Donald Trump. Eu mesmo, num ato de bisbilhotice mórbida, visitei o Dakota Building, no Upper West Side, em Nova York, última morada de John Lennon. Sempre tive vontade de ir à Big Apple, mas nunca tempo (leia-se money, tutu, bufunfa, $$$ mesmo). A poucos metros a pé, ou em centímetros pelo mouse pad, chego ao memorial “Imagine”, no Central Park.
Em outras épocas, esse “turismo virtual” seria impensável. Nelson Rodrigues, que era "cabeçudo como um anão de Velásquez”, como ele próprio definia, guardou em sua cabeça-balão crônicas memoráveis da Zona Norte carioca, onde morou no início do século 20. Numa dessas histórias, se recorda de Lili, uma vizinha gostosa por quem o escritor, aos seis anos, se enamorou. Lili se apaixona por um jovem tuberculoso. Como bem se sabe, a doença, na época, era letal. Cansada das surras do pai, que não aceitava o destino do moço, Lili tocou fogo no próprio corpo. Nelson lembra, aterrorizado, de caminhar pela calçada enquanto ouvia a vizinha “arder como uma estrela”.
Vejam. O curioso Nelson caminhava despretensiosamente pelo passeio público quando ouviu Lili estalar em chamas. Por mais que o autor não ilustre a cena, ao menos da maneira que o “Earth” faria com as ruas de Paris ou Bangu, sua narrativa transmite ao leitor o hálito quente de churrasco que invadiu as narinas do menino, imóvel, sob a janela da moça.
A crônica de Nelson só nasceu porque o escritor deslizava pelas ruas como um Baudelaire suburbano. Ao flanar por entre os paralelepípedos da Zona Norte, percebeu que o ser humano é tão cruel como curioso. Desde sua infância, há 6 mil anos, o homem mata e morre de quinze em quinze minutos (no Rio, já superamos a marca). Ao vivenciar – do latim viventia, fato de ter vida, de viver; existência, experiência da vida - histórias como a de Lili, Nelson concluiu que a solidão nasce da convivência humana.
De volta ao “Earth”. Reza a lenda que o programa foi idealizado pelo governo americano, em meados da década de 60, para espionar os russos. Com a queda do muro de Berlim, a democratização da Internet e os avanços da tecnologia aeroespacial da Nasa - que hoje em dia só usa satélites made in Taiwan (bem mais em conta, dizem) -, qualquer pessoa, com no mínimo um acesso discado em casa, pode ir aonde Cabral jamais esteve antes. Ao menos virtualmente.
Numa época em que a busca por prazeres virtuais supera, em muito, os reais, o Google Earth supera, em muito, as calçadas e bancos de praça. Nelson disse, certa vez, que a televisão matou a janela. Pergunto, então, aos meus botões, se a utilidade do “Earth” vai além da visualização digital de tetos e ruas, ou apenas entrega que a piscina do vizinho é maior do que a sua. A Terra vista daqui debaixo é tão mais bonita. Cartas para a redação.
Por fora do "Earth"? Então baixa aqui.
Gente nua pelo Google Earth? Também tem, mas sem a definição que o mão peluda gostaria: http://googlesightseeing.com/index.php?s=topless
14.2.07
Cuba para os... cubanos?
16.1.07
O verdadeiro íntimo
Conheci Pierre na madrugada de sábado. Uma tentativa de checar os emails, após sair da sessão de meia-noite do Arteplex Botafogo, selou meu destino pelas próximas três horas. Fui bombardeado por ilustres desconhecidos: Fani (como funny, do inglês, ou faniquito, do português mesmo), um híbrido de Bruna Surfistinha com Nestor Kirchner de Nova Iguaçu, se atracou com o alemão Diego, que estava a fim de Irislene (sic), uma interiorana diretamente de Uberlândia para uma latinha de cerveja em algum canto da mansão BBB. Em outro, estava Pierre.
O vi pela primeira vez nos momentos finais da festa Vamp, ao vivo e em tela inteira de plasma do computador. Esparramado na cama, acompanhei Bruno, Liane, Daniel, Analy, Flávia Ayrton etc etc... tipos ordinários como você e eu. Só peguei no sono quando terminou a festa (ou seja, após sessões privadas de vômito dos BBs). Mas eis que, ao ligar a TV na noite seguinte, lá estava ele, Pierre, a quem tratei com a maior intimidade.
Pierre, fã de Cazuza e Tati Quebra-Barraco, é até um rapaz bonitão. Aliás, como 95% dos Brothers atuais. Gente feia não entra na casa do Boninho. O boato que corre é que os feios, que coincidiam de ser também bem pobrinhos, vinham levando as últimas edições do reality. Vejam. Cida, do BB4, era babá. Mara, do BB6, auxiliar de enfermagem na Bahia e lavadeira de roupas oficial da casa. No BB5, deu Jean. Intelectual e homossexual premiado? Ora bolas, e ainda dizem que no Brasil justiça não é feita.
Aparentemente, as duas “qualidades” - pobre e feio -, indesejáveis até para o filho do vizinho, valiam aos Brothers a simpatia imediata do público, tornando as últimas edições do BB um jogo de cartas marcadas.
Para salvar o reality show do marasmo e somar preciosos pontos do Ibope, tomaram outra providência condenável: Arrancaram-nos o direito de mentir. Ou melhor, de mentirem para a gente. Instalaram um detector de mentiras no confessionário. Um ultraje! Não há mais segredos entre o Brother e o espectador. Ele não nos engana mais.
Com a mentira foi-se também o mistério do sorriso maroto, a dúvida da voz trêmula, o suor frio mudará de temperatura. Enfim, foi-se a graça.
Imaginem se a moda pega. O recurso será utilizado em salas de aula, elevadores, áreas de não-fumantes dos maiores escritórios do país, no pescoço do Maluf. Onde for possível instalar uma câmera e um detector de mentiras, a fofoca não estará.
O ser humano é o único ser que mente. Não se vê um casal de pombos na Cinelândia desviando uma porção de milho para dar de comer às suas rolinhas famintas. O tigre, o leão, o sapo, o boi, a foca hão de ser o que são eternamente. Tudo bem que tem muito camaleão desfilando de colarinho branco por aí. Mas são poucos os animais que se falsificam. Ou alguém já viu escândalo do mensalão entre os lêmures de Madagascar? Me pergunto como seria um Valerioduto canino.
-Querido, o Rex voltou a fazer buracos no jardim.
-Não se preocupa amor, é que os abrigos do canil entraram em obra e o Rex precisa de um lugar para esconder os fundos da licitação.
Não sei se me entendem. Mas para os humanos, acabar com a mentira é aflorar um pouco de seu instinto animal. A mentira é o último recurso da verdade.
Essas últimas linhas são escritas enquanto Bial comanda o “paredão” de domingo. Torço para que Pierre não seja eliminado. Odeio perder um amigo.
Leiam também o Blog do Pierre, quase com o mesmo número de acessos que o meu, óbvio. Para um perfil dos demais participantes, romances, fofocas e afins, visite o site oficial do BBB.
7.1.07
Artistas da Fome
Mas como? Comer talvez seja a maior verdade histórica. Não comer? É antinatural, anti-humano. Encaremos: são antimeninas.
Em vez de restaurantes a R$ 1, no futuro teremos batalhões ensandecidos de meninas nas ruas exigindo estabelecimentos de estética pelo preço mínimo. Claro, o problema deixou finalmente os salões de beleza para tornar-se assunto de saúde pública - “adolescentes vítimas de anorexia mexem com o mundo”, lê-se nas retrospectivas de fim-de-ano.
Que a gordura extra na carne incomoda isso é fato. É fato que a sua ausência também incomoda, principalmente quando vira espetáculo, como no personagem de Kafka. Confinado em uma jaula, o “artista da fome”, incapaz de tragar mera migalha de pão, atraía multidões nas cidades européias. Sua única tristeza era não poder jejuar por mais tempo, uma vez que seu empresário limitava o prazo de abstinência em quarenta dias. À medida que o tempo ia, as pessoas se interessavam por outras formas de diversão, e passaram a ignorar o artista. Até que, confundido com a palha podre da jaula, o artista teve forças para uma confissão ao inspetor de circo:
-Eu queria que vocês me admirassem, mas não deveriam – disse o artista.
-E por que não? – retrucou o inspetor.
-Porque eu nunca encontrei uma comida que gostasse... se tivesse encontrado alguma, acreditem-me, não teria feito toda esta confusão. Teria me empanturrado como você ou qualquer outra pessoa – falou, antes de ser enterrado com a palha apodrecida e dar lugar a uma jovem pantera, bem alimentada, da qual os espectadores não desgrudavam os olhos.
Se fosse nosso contemporâneo, e mulher, o “artista da fome” teria status de cânone da beleza. Visitaria o Faustão aos domingos e contracenaria com a Grazi em “Páginas da Vida”. Volto ao que queria dizer: o mundo de hoje tem algo de Kafka.
Não é necessário ir muito longe. Tratarei os exemplos pelos números, dado que, no ano passado, os obituários o fizeram por pesos e medidas. Ana Carolina Reston, 40 Kg e 1,74m, 21 anos, modelo, vítima de anorexia e de infecção generalizada causada pelo estado de fragilidade extrema. Rosana de Oliveira, 23 anos, manicure, morreu após três anos convivendo com anorexia. Tinha 40Kg e 1,68m. Beatriz Cristina Ferraz, 23 anos, estudante, sofria da doença há quatro anos. Morreu no banho, parada cardíaca, na véspera de Natal. Chegou a pesar 27 kg.
Isto sem falar na uruguaia Luisel Ramos, de 22 anos, que sofreu parada cárdio-respiratória fulminante em pleno desfile. Como que num espelho da doença, depressiva, solitária, escondeu-a do público até o último momento – caiu quando ia da passarela para o camarim.
O irônico é pensar que muitas sequer passaram fome na vida. São filhas da classe média, média-alta, alta, AA, outras bem-sucedidos pilares da moda, saudáveis, cercadas de conforto por todos os lados. Algumas até polpudas em certos momentos da vida. Nunca lhes faltou um prato de filé com batata frita na mesa. Está para nascer uma miserável anoréxica.
Vaidade não escolhe classe. Sei. Se lhes resta um mísero tostão furado no bolso que pague a refeição, contudo, ouve-se logo da mãe desdentada: “As criancinhas na África dariam de tudo para ter esse pouco de comida que você tá recusando”. As mães e suas verdades... desmantelam qualquer um.
Até os 13 anos tive um vizinho chamado Ademardo – ou Adê, para os íntimos. Vejam, já não se fazem mais vizinhos chamados Ademardo, que é nome de vizinho, assim como Oliveira ou Helinho. Também não se fazem mais vizinhas gordas como as de Nelson Rodrigues. Se antes os homens eram magros, olhos esbugalhados, peito cavo, as mulheres tinham que ser gordas. Hoje uma gorda não passa sem um sinal de exclamação ao lado. “Gorda! Gorda!”, repetem em coro.
Como num lampejo de sobriedade, a Marie Claire desprendeu suas folhas da mediocridade que cerca o mercado editorial brasileiro – um abutre que repica mesma carniça, semana após semana, até que o assunto apodreça ou pinte carne fresca – para discutir a anorexia como problema fora das passarelas: o padrão de beleza é imposto a todas as mulheres, não só às modelos. Mesmo que a capa da revista trouxesse estampado o magérrimo furacão almodovariano, Penélope Cruz.
Leio ainda que tubos de alimentação, usados para injetar nutrientes à força nos corpos subnutridos, são símbolo de status entre um grupo de meninas. Fecho os olhos com vontade de dizer-lhes, "sejam gordas, meninas, sejam gordas".
21.12.06
Ditadura do Som: Ipod, Zen Vision e afins mataram a imprevisibilidade
Quem já teve, tem – senão, provavelmente terá – acesso a essas maravilhas sabe o prazer que 80 gigabytes de música podem proporcionar à orelha presente. A click wheel do iPod é uma verdadeira dama. Macia, ágil, sensível, de low action. Não escolhe parceiros: vai de Jobim a Pitty em menos de 720 graus. É a roda da fortuna dos afortunados. Que democrática!
O produto da Creative não deixa por menos. Tem qualidade de vídeo superior (são 262 mil cores contra 65 mil do iPod), proporcionando mais contraste e nitidez, sem contar que é possível transmitir os vídeos pelo aparelho de TV, mesmo nos de alta definição. Puro deleite visual.
Tudo bem. Onze entre dez humanos não trocam seus fones brancos por nada, nem mesmo por sua... liberdade?! Eis o que quero dizer: não há espaço para a espontaneidade no mundo dessas maravilhas tecnológicas.
Vejam. Assim que se ganha seu primeiro iPod, instala-se o iTunes, empilha-se o máximo de CDs próximo ao computador e, literalmente, atulha-se o maior número de faixas que o seu dinheiro permitir para dentro do aparelho. Tudo para se livrar de um estorvo que só faz peso na prateleira (a Secretaria de Segurança pública já mexe seus pauzinhos para dar conta dos condenados suportes plásticos da Casa & Vídeo). Na era da praticidade rareiam os espanadores, caíram em desuso pois se chegou à seguinte obviedade: a música é um meio imaterial (sic), inodoro, invisível. E quem teria sido o idiota a inventar que precisamos tirar-lhe a poeira ao menos duas vezes por semana?
Vimos que os iPods da vida não têm cheiro, não sujam, não reclamam espaço na estante. Perto das velhas bolachas de LP, os mp3s são seres independentes, puros, divinos. Esses espíritos de luz própria que vagam pelos ouvidos, contudo, obedecem a uma regra: tocam apenas o que lhe foi injetado, não pensam por si próprio. Os aparelhinhos divinos são burros!
Como não há ninguém por trás da tela de LCD para determinar o que tocará em seguida, os computadorezinhos são largados à própria sorte. E, como o Lula em brincadeira de par ou ímpar, fazem o que lhes foi programado, play next song, please.
Um idiota da objetividade protestaria em favor da vastidão de possibilidades, de opções, que incluem até a opção random (traduzido do inglês significa, entre outras coisas, aleatório, ou ainda sem propósito ou objetivo, sem sentido). Este recurso embaralha as músicas e, como o nome propõe, as toca sem ordem pré-estipulada. Uma definição mais avançada do Babylon choca: unpredictable. Vejam como até o dicionário mente, trapaceia, nos burla a paciência. O que há de imprevisível se todas as músicas no playlist “inesperado” foram pré-selecionadas pelo próprio usuário no iTunes? O “mistério” repousa, ainda, na prateleira.
Na contramão do boom de autômatos, o rádio resfolega os últimos suspiros de franqueza. Repousa aí o verdadeiro mistério. Existe uma troca no rádio, do dj para o ouvinte, de ser humano para ser humano, eis a novidade, aí está a surpresa. Os aparelhos de mp3 são solitários, revelam um isolamento compartilhado apenas por aqueles próximos, amigos, vizinhos namoradas etc. etc.
Escutar rádio é se expor ao desconhecido, render-se à surpresa em um mundo de mistérios descartáveis, velozes, tecnológicos. Prova disso é que o rádio prevalece, desde a década de 30, como o principal veículo de comunicação, divertimento e formação cultural no Brasil. Li que os novos Zen Vision da Creative virão com a modulação FM instalada. Mas quem lhe dará atenção, tendo 80 G do próprio gosto para se satisfazer?